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PRE-HISTÓRIA: DO PERÃODO PALEOLÃTICO A CULTURA BADARIANA

História do Egito Antigo - 22/05/2020 , ESTUDOS - PARTE II

Resenha resumo do livro: SHAW, IAN. The Oxford History of Ancient Egypt. 1ª Edição. United States, New York: Oxford University Press Inc., 2003. 525p
 

PRE-HISTÓRIA: DO PERÍODO PALEOLÍTICO A CULTURA BADARIANA

 

             Ian Shaw, inicia o primeiro parágrafo com a frase “(...) o Egito é um dom do Nilo por causa das enchentes do rio (...)”.  Explica, que desde cedo, os habitantes do Egito viveram em diferentes tipos de meio ambiente.   Em primeiro lugar, o clima não era tão árido como agora e segundo, o rio em si nem sempre era um rio sinuoso em uma ampla planície de inundação, com as altas inundações do final do verão. Por causa de sua posição geográfica, o Egito serviu como uma importante rota desde muito cedo de imigrações humanas para o resto do mundo, o que o próprio autor deixa claro, na página 22, que a teoria da saída dos primeiros humanos da África é contestada por bons antropologistas (que demonstram uma rota contrária, vindo da região da Mesopotâmia, por exemplo). 

 

O BAIXO PALEOLÍTICO

 

          Muitos artefatos do baixo paleolítico, incluindo machadinha de pedra do tipo de indústria acheuliana[1], porém nenhum osso humano foi achado para associar com esta fase acheuliana.  Em virtude da erosão causada pelo rio houve a dispersão de muitos destes achados e seus correlatos.  Achados em Deir el-Medina, Vale dos reis e no site de Luxor, não podem ser datados, por serem parte desta dispersão causada por intensa erosão.  No deserto ocidental, muitos sites da fase final da indústria acheuliana sçao conhecidos, especialmente aqueles no oásis de Karga, Dakhla, Bir Sahara e Bir Tarfawi.  Todos estes sites são do tempo em que os habitantes do local eram caçadores e coletores.  Muito do que se conhece destes sites, os quais estão em mau estado de conservação, ocorreu por observação de caminhos descobertos pelo radar do ônibus espacial.

 

O MÉDIO PALEOLÍTICO

 

          O quadro emergente neste período é muito complexo, pois se origina no último período da indústria acheuliana, quando as machadinhas foram associadas com cortes bifaciais e um típico método Nubiano de partir a pedra.     Quando se observam o grande número de artefados do período, verifica-se que a população também era alta. O médio paleolítico no Egito, assim como em muitas partes do velho mundo, é caracterizado pela introdução do Método Levalóis, uma técnica especial de corte na pedra para produção de lascas e lâminas de determinadas dimensões a partir de um nódulo de sílex.  O método levalóis Nubiano também se apresenta na produção de pontas de flechas. Em Bir Tarfawi e Bir Saharan no deserto ocidental, numerosos sites foram escavados. Durante muitos períodos de ocupação existiram lagos permanentes nestes locais, o que em algumas fases, poderiam ter mais de 7 metros de profundidade. Foram lagos e praias, onde houveram ricos recursos da flora.  A fauna poderia consistir de lebres, porco espinho, gato do mato, podendo também haver búfalos, rinoceronte, girafas e outros finalmente.  Estes sites eram abandonados quando da ocorrência de períodos de seca.  Neste período, também houve ocupação de sites no vale do Nilo. São sites contemporâneos com os do deserto ocidental, cuja ocupação ocorre em Nazlet Khater e Taransa.  Existes grupos diferem em termo no método de corte usado na pedra. O “grupo K”, utiliza o método Levalóis clássico e o “grupo N”, frequentemente usa o método Levalóis Nubiano. O final deste período é marcado por brusca mudança nas condições ambientais, tornando o clima hiperárido e continuando assim, tornando os recursos alimentares escassos nas planícies de inundação e obrigando as populações se mudarem para área do vale do Nilo.  

 

 O ALTO PALEOLÍTICO

 

          Sites do alto paleolítico são raros no Egito.  O site de Nazlet Khater-4, por exemplo, não mais mostra traços de técnica Levalóis em sua indústria lítica.  A produção é destinada a obter lâminas a partir de um núcleo de plataforma simples.  Os estudos, do meio ambiente da época, mostraram o site, funcionando como um campo de caça e pesca.

 

O PALEOLÍTICO FINAL

 

          Em contraste com o alto paleolítico, muitos sites tem sido encontrados no alto Egito, datando entre 21.000 a 12.000 a.C.  O clima hiperárido promove no Nilo menos agua e mais movimento de argila nas cabeceiras com importante atividade de erosão e um frio glacial tardio que afeta as terras altas da Etiópia. Esta argila misturada ao rio, forma um aluvião espesso e resulta em uma área de várzea (planície de inundação) que na Nubia poderia chegar de 25 a 30 metros.  Existe uma grande variedade tipológica entre os sites do período paleolítico final e o alto paleolítico, o que dificulta determinar as origens do paleolítico final. Entre os diferentes grupos destacam-se, os Fakhurian (21.000 – 19.500 a.C) são mais antigo, com sites definidos em Wadi Kubbaniya, perto de Aswan e sites achados também perto de Esna e Edfu.  Foram encontrados lagos temporários que se enchiam após as inundações do Nilo, o que com o tempo foram sendo bloqueados pelo aparecimento de dunas.   Nestes locais, houveram condições ambientais favoráveis para caçadores coletores.   Estes sites foram usados por pequenos grupos de pessoas, muitas vezes no ano por longo período. A flora era sazonal, podendo haver no local, camomila, capim noz, o que serviu à alimentação destes grupos, o que se acrescenta a pesca de tilápia e outros peixes.  Em adição a pescaria, poderia haver a caça de antílopes (como o ímpala, gazelas, etc..), gado selvagem.   A mudança climática para o final do último período da era do gelo, resulta em uma incomum discarga de aguas no Nilo entre 13.000 – 12.000 a.C. criando excepcionais inundações.  A indústria lítica do período caracteriza-se por técnica de batidas ásperas, que resultam em largos flocos de pedra e ferramentas como raspadores.  Parece, como no site de Makhadma-2 a pesca de Clarias foi a base econômica.  Em escavações de cemitérios como Gebel Sahaba, é verificado um evento dramático, pois existe enterros que confirmam algum quadro de violência, onde 50% dos mortos representam mulheres e crianças.  Acredita-se que as mortes podem ter sido causadas pelas condições de vida morando no Nilo selvagem.  Após o paleolítico final, verifica-se um hiato da presença humana no vale do Nilo por parte destes grupos de caçadores-coletores, certamente pelas condições ambientais adversas com a redução de cheias do Nilo.

 

  O NEOLÍTICO INICIAL NO SAHARA

 

          O deserto ocidental foi abandonado para o final do médio paleolítico e por causa disto não existe presença humana antes do Neolítico inicial e pelo esvaziamento desta área, as condições arqueológicas estão bem preservadas.  A diminuição de chuvas no período leva a uma mudança das populações destas áreas, formando assentamentos no vale do Nilo, pela busca de novas possibilidades de sobrevivência.   A agricultura não é atestada ainda neste período, ficando as evidências marcadas pelo pastoreio de gado.  Existem diferenças entre o processo de “Neolitização” entre as culturas existentes por exemplo na região da atual Israel e no Egito, onde no primeiro caso temos agricultura e presença de cerâmica, o que há uma ausência na região do Sahara no neolítico inicial.   Já antes de 7.500 a.C., é possível que grupos de pastoreio de gado vinham do deserto somente após as chuvas de verão, o que coincide com o período de inundação do Nilo, o que dificulta para arqueologia achar instalações de pastoreio,  Depois deste período de 7.500 a.C., existem escavações de poços que atestam sites como Bir Kiseiba e outros sites.   A escassez de ossos de animais, indica que os animais eram usados mais para o consumo de leite e sangue (costume até hoje utilizado por grupos nômades do deserto do Sahara).  Este período é marcado pela domesticação de gado como uso de fonte de proteínas e o aparecimento da domesticação de ovelhas e cabras (aproximadamente em 5.600 a.C.).

 

O MÉDIO NEOLÍTICO

 

          O médio neolítico apresenta uma dramática mudança na tecnologia neolítica.  A produção de lâminas se caracteriza por produção de lascas bifaciais.  Grandes pedras polidas são encontradas, paletas, ornamentos e cerâmica.  Em Nabta Playa um notável complexo megalítico é encontrado, consistindo de três partes. São pedras (de 2 x 3 metros) alinhadas em uma circunferência de 4 metros de diâmetros e duas lajes tumulares cobertas.  Esta construção megalítica representa claramente uma arquitetura pública e uma incrível complexidade social.  Em Dakhla Oasis, muitas unidades arqueológicas tem sido distinguidas e as principais fases conhecidas são: Masara, Bashendi e Sheikh Muftah.

 

Nabta Playa Calendar Circle, reconstruído no museu Aswan Nubia 

 

           PERÍODO NEOLÍTICO NO VALE DO NILO

 

                    No vale do Nilo, nenhum outro traço tem sido achado de grupos que moraram no lado oriental ou ocidental do deserto (leste ou oeste do Sahara), exceto as culturas de Elkabian e Qarunian.    Não existe indicativo para uma cultura agrícola como a encontrada no Levante (atual região da Palestina e indo até a proximidade da Mesopotâmia), o que se vê é o tradicional caminho da vida, baseado na pesca, caça e coleta.   Não existe informação arqueológica de populações humanas estabelecidas no vale do Nilo para o período entre 7.000 a 5.400 a.C.  após este período se verificam desenvolvimento de culturas como no site El-Tarif e Fayum, onde são encontrados artefatos, potes, poços e locais para armazenamento de grãos.  Um largo assentamento em Merimda Beni Salama com 5 níveis correspondentes aos estágios desta cultura entre 5.000 a 4.100 a.C., demonstra a existência de uma indústria lítica, criação de animais (ovelhas, gado e porco), pesca e caça.

 

CULTURA BADARIANA

 

           Por cultura Badariana, entende-se o desenvolvimento social-econômico ocorrido a região de El-Badari, perto de Sohag com desenvolvimento de um processo agrícola no alto Egito. Existem estudos arqueológicos dos locais de sepultamento que provam estes assentamentos.  Os potes encontrados nestas escavações mostram elementos característicos destes assentamentos, potes de fabricação manual e também com uma técnica muito refinada de tempera. Dado os limites de informação é permitido verificar um certo contato com estrangeiros, pois são verificados nos enterros, conchas vindas do Mar Vermelho e cobre vindo do Sinai, mostrando uma ligação cultural Badari-Sinai.

 

O PERÍODO NACADA

 

          A segunda maior fase do período pré-dinástico, a cultura Nacada, deriva do nome do site de Nacada, no alto Egito, quando em 1892, Flinders Petrie descobriu um vasto cemitério com 3.000 sepulturas.  Potes achados, vasos cerâmicos polidos, na cor vermelha e topo negro, paletas com traços zoomórficos, pentes e colheres de osso ou marfim, artefatos estes que demonstram este peculiar tipo de indústria local.  O período Nacadiano, foi dividido em 3 fases: Nacada I, II e III, terminando com a ascensão do rei Menes no início da 1ª Dinastia.   A sequência de fases Nacada I ou cultura de Amira, site de El-Amira, corresponde ao vaso vermelho com topo preto e os vasos com pintura e motivos decorativos.   

 

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          A fase Nacada II ou cultura Gerzeana, site de El-Gerza, contem estilo de cerâmica caracterizado por aparecimento de vasos com alças onduladas e decorações com tinta marrom.

 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Cultura_de_Nacada#/media/Ficheiro:%C3%84gyptisches_Museum_Berlin_057.jpg

 

          Finalmente a fase Nacada III, ou cultura Semaineana (desenvolveu-se de 3.200 a 3.000 a.C.), que foi marcada pelo aparecimento de um chamado estilo que já evoca potes do período dinástico.  De acordo com Petrie, durante a fase Nacada III, ocorre a chegada de asiáticos e está “nova raça”,  vai trazer, as sementes da civilização faraônica.  O período marca um envolvimento e um contato intercultural e comercial, muito significante com estes asiáticos (vindos da palestina), havendo uma substituição de ferramentas e peças de pedra por metal.  Não apenas simples peças como pontas de arpões, mas varas, espátulas e machadinhas, resultado do processo advindo do progresso tecnológico e a genuína simbiose entre as duas regiões (Palestina e Egito).   Outra marca é a grande variedade de animais domesticados como porcos, bois, cabras e ovelhas usados na dieta alimentar e até mesmo o cão como companheiro e ajudador de tarefas como pastoreio.  O burro é usado para transporte de mercadorias.  Quilos de grãos achados, estocados em jarros, inclui, variedades de trigo.  São também encontrados centros de adoração com importante status simbólico diante da sociedade.

 

[1] Industria Acheuliana é caracterizada pela presença de equipamentos de pedra bifaceados